quarta-feira, 19 de junho de 2013

Infarto do miocárdio

A inveja come o coração da gente.
É um vírus inato. Adormecido no corpo. Alguma coisa o anima.
É um estopim para uma revolução celular e um tumor brota como uma flor nos órgãos.
As veias todas se retorcem.
Um arrepio percorre todos os nossos sentidos.
Um aviso de que se está vivo. De que se é sozinho. De que se tem ardências. De que os chacras vibram. De que o sangue percorre a 23km/h e por isso é quente. De que sou um corpo fechado.
De que não suporto a ideia do outro.
Estou vivo e meu corpo se arrepia.
Fiquei feliz e imediatamente enrubescido.
Depois uma dormência tomou meus braços
E uma grande culpa por estar imóvel diante disso.
Poderia ser eu. Poderia ser meu.
Mas não é
E permaneço no trópico de mim mesmo
Inerte
na poesia de pertencer à minha própria natureza
de ser mórula blástula gástrula nêurula
virar um templo de células
um ecossistema em crise
e depois despir-me
em aminoácidos
que nutrem essa própria terra
trópico
morena
indígena

Brasil.

Steak Tartare


O prato que se come cru.
Não gosto de sangue, no entanto ele insiste em me habitar e caminhar em minhas trilhas.
É cru e eu o como amargamente. O sangue escorre.
É bom quando se tem anemia.
Aliás é uma doença típica de alguém que não suporta sangue, não suporta ser gente.
Mas agora me sinto viva. Todas as minhas metáforas despertaram. E quando a inveja desperta, passo a habitar no outro e sentir a outra face do mesmo movimento que nele ocorre, é algo de simbiótico.
E me pergunto: o que é que eu fiz para não merecer isso?
Talvez não seja a hora. Não desejo o mal de ninguém, mas sinto um minuto, talvez dois de uma raiva metabólica... ela é natural. Como dormir é natural. Como a poesia é natural.
Estou muito viva.
Meus pêlos arrepiam-se e o meu corpo todo é tomado de uma agitação:
Por que não eu?
Porque todos os sonhos são visões e sua paisagem ainda é essa, árida. Ainda não pode se imaginar. Porque seus deleites estão bem mais próximos e não podem ser sintetizados do outro lado do mundo. Porque seus dogmas ainda não foram desfeitos. Porque é preciso ser um campo arado para que as raízes brotem. É preciso que haja fungos. Rizóides. Estar tomado por fractais e pequenos poemas.
É preciso ser doce.
Mas a minha seiva anda espessa. Talvez por não compreendê-la, minha boca se amargue um pouco.
Já são quase dois minutos.